CONSIDERAÇÕES INICIAIS E NATUREZA JURÍDICA
Na ação de cumprimento, cuida o artigo 872 da CLT, ao dispor: "Art. 872. Celebrado o acordo, ou transitada em julgado a decisão, seguir-se-á o seu cumprimento, sob as penas estabelecidas neste Título.
Parágrafo único.
Quando os empregadores deixarem de satisfazer o pagamento de salários, na conformidade da decisão proferida, poderão os empregados ou seus sindicatos, independentes de outorga de poderes de seus associados, juntando certidão de tal decisão, apresentar reclamação à Junta ou Juízo competente, observado o processo previsto no Capítulo II deste Título, sendo vedado, porém, questionar sobre a matéria de fato e de direito já apreciada na decisão.
Tal norma acha-se inserta no Capítulo IV (Dos Dissídios Coletivos), do Título X da CLT, que trata Do Processo Judiciário do Trabalho, ao qual se refere o caput do dispositivo. Seu parágrafo único reporta-se ao Capítulo II desse Título, que cuidado.
Processo em Geral, assim dispondo, o legislador conferiu à ação de cumprimento a natureza de ação de conhecimento, equiparando-a a uma reclamatória trabalhista.
Aliás no particular, ação de conhecimento condenatória.
Com efeito, não se pode perder de vista que a ação de cumprimento tem por finalidade a realização in concreto do que fora estabelecido in abstracto na decisão normativa ou no acordo homologado, do processo de negociação coletiva que resultou na instauração de dissídio coletivo e no eventual uso do poder nora motivo atribuído à Justiça do Trabalho pela Consoante leciona Emílio Gonçalves.
"Ao proferir a sentença normativa, o Judiciário do Trabalho não cumpre a função normal de declarar o direito no tocante a relações jurídicas preexistentes, mas sim, a de criar novas normas jurídicas obrigatórias para os integrantes das respectivas categorias econômicas e profissionais" Æ, lembrando que a sentença normativa possui efeitos erga omnes, aplicando-se a todas as pessoas que pertencem às categorias representadas no dissídio pelas entidades sindicais, ainda que não associadas arremata: 'CAS condições de trabalho fixadas na sentença normativa inserem-se no conteúdo dos contratos de trabalho das categorias abrangidas pela sentença, como ocorre Com as convenções coletivas de trabalho'.
De fato, enquanto o processo negocial objetiva a constituição de novas situações jurídicas, 0 estabelecimento de novas condições de trabalho para os integrantes de dada categoria profissional, conferindo ao dissídio coletivo econômico a qualidade de uma ação constitutiva, e, por conseguinte, de mesma natureza a sentença nela proferida Cumprimento segundo Amaro Barreto, apud Emílio Gonçalves ação de conhecimento para individualizar o comando geral contido na sentença normativa, tal qual a ação comum personifica o comando geral inserto na norma legal".
Não se trata, por outro lado, de execução para cumprimento de título executivo judicial, a que alude o art, 584 do CPC/73, nem de qualquer modalidade executória anteriormente conhecida sob a denominação de ação executiva. Se se tratasse de cumprimento de título executivo judicial, o procedimento iniciar-se-ia com os atos executórios, ensejando-se, apenas depois, a cognição. Não é isso, porém, o que ocorre: nos dissídios individuais de cumprimento de sentença normativa, a cognição precede os atos executórios".
Este também é o entendimento de Wagner Gigli05: "O conteúdo da decisão normativa não é executado, mas cumprido; da mesma forma pela qual são cumpridas outras normas jurídicas: espontânea ou coercitivamente através de ações judiciais de processos individuais".
As lições desses estudiosos tiveram guarida nos tribunais, conforme se depreende da ementa do acórdão proferido pela Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, in verbis:
"A sentença que fixa condições de trabalho não é condenatória, mas sim constitutiva. Daí a impropriedade em execução da mesma. Impossível confundir com esta última ação diversa que é a de cumprimento prevista no art. 872 da CLT e que tem por objeto imediato a prolação de uma sentença que poderá ser meramente declaratória — no caso de improcedência do pedido inicial — ou também condenatória, esta sim passível de execução. Direito é ciência e como tal as expressões que lhe são pertinentes têm sentido, devendo as partes, por intermédio dos profissionais da advocacia, membros do Ministério Público e magistrados, esmerarem-se na linguagem, contribuindo, assim, de forma eficaz, para o aprimoramento da própria ordem jurídica. Não se olvide que a linguagem revela a própria cultura e desenvolvimento de um povo."
Destarte, Porque reconhecida pela lei, pela doutrina e pela jurisprudência, a ação de cumprimento é ação de cognição, de natureza condenatória, que propicia às partes o direito à ampla defesa e ao contraditório, enquanto discussão sobre toda e qualquer matéria de fato ou de direito, desde que não se trate de matéria já apreciada na sentença normativa ou no acordo homologado.
Finalizando este tópico importa ressaltar que a Lei no 7.701, de 21 de dezembro de 1988, que dispôs sobre a especialização de Turmas dos Tribunais do Trabalho em processo coletivo e deu outras providências, contém dispositivos que se referem expressamente a ação de cumprimento, estabelecendo no § 60 do artigo 70 que a sentença normativa poderá ser objeto de ação de cumprimento a partir do 200 dia subsequente ao julgamento, fundada no acórdão ou na certidão de julgamento, dispensando-se a necessidade do trânsito em julgado para o seu ajuizamento, como, aliás, já reconhecia a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, cristalizada no Enunciado no 246: É dispensável o trânsito em julgado da sentença normativa para propositura da ação de cumprimento.
CABIMENTO E COMPETÊNCIA
Como dito alhures, e porque previsto expressamente na norma legal, a ação de cumprimento cabe quando os empregadores deixarem de satisfazer o pagamento de salários, na conformidade da decisão proferida.
De imediato, poder-se-ia questionar se só seria admitida a ação de cumprimento quando a decisão normativa envolvesse o pagamento de salários (fixação de piso salarial, índice de reajustamento, etc.). À toda evidência, esse não é o sentido da norma. A bem da verdade da ação de cumprimento se estende a quaisquer outras condições de trabalho previstas na sentença normativa, e não observadas pelo empregador. Na precisa lição de Emílio curial que, neste passo, o legislador minus dixit quam vo/uit. Por outro lado, se a lei não predetermina o conteúdo da sentença normativa, como o faz em relação a convenção ou acordo coletivo (art. 613); se a sentença normativa é a (sic) substitutivo da convenção e pode regular não apenas os salários como outras condições de trabalho, razão inexiste para que se restrinja a ação de cumprimento apenas à questão de salários."
Quanto à competência para conhecer, conciliar e julgar a ação de cumprimento a mesma é atribuída a 1 a instância da Justiça do Trabalho, ou seja, às Varas do Trabalho ou, Fe for o caso, ao Juiz de Direito investido na jurisdição trabalhista, na conformidade do que preceitua o parágrafo único do artigo 872 da CLT. No dizer de Mozart Victor Russomano, apud Emílio Gonçalves "abre-se, aqui, exceção ao princípio de que o juízo que prolatou a sentença o órgão competente para executá-la.
No particular, surgem duas questões que, durante algum tempo, foram bastante controversas. A primeira envolve a competência da Justiça do Trabalho para a ação movida por sindicato de empregados contra empregador objetivando o recebimento da taxa assistencial em favor do sindicado de classe fixada em dissídio coletivo, A segunda diz pertinência à possibilidade da ação de cumprimento para garantir a eficácia de cláusulas constantes de instrumento normativo diverso da sentença normativa, como o acordo coletivo de trabalho 00a convenção coletiva de trabalho. Registre-se que esses instrumentos também podem envolver a questão relativa ao recebimento da taxa assistencial em favor do sindicato.
Quanto à primeira questão suscitada, até antes da Constituição Federal de 1988, jurisprudência majoritária, inclusive do Supremo Tribunal Federal, apontava para a incompetência da Justiça do Trabalho. Vide a esse respeito o Processo CJ no 6.476-4-SP (STF), o Processo CC no 5.423-SP (TFR) e a Súmula no 87, do TFR
("Compete à Justiça comum estadual o processo e julgamento da ação de cobrança de contribuições sindicais"). Tal diretriz teve por fundamento o fato de que a cobrança da taxa assistencial só indiretamente decorreria das relações de trabalho, havend0ï na verdade, simples litígio entre entidades privadas.
O próprio Tribunal Superior do Trabalho agasalhou essa tese, expedindo o Enunciado no 224: "A Justiça do Trabalho é incompetente para julgar ação na qual o sindicato, em nome próprio, pleiteia o recolhimento do desconto assistencial previsto em sentença normativa, Convenção ou acordo coletivos". (Resolução Administrativa no 14/85, de 12.9.85).
Com o advento da Constituição Federal de 1988, a jurisprudência passou a admitir a competência da Justiça do Trabalho para apreciar litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias decisões, inclusive coletivas, de forma que o Enunciado no 224 do TST foi revisto pelo de no 334, que dispôs: A Justiça do Trabalho é incompetente na qua/ o sindicato, em nome próprio, pleiteia o recolhimento do desconto assistência/previsto em convenção ou acordo coletivos. Resolução no 26, de 27.4.94.
Como se vê, ficaram de fora da competência do Judiciário trabalhista apenas as questões que envolvessem o recolhimento do desconto assistencial previsto em convenção ou acordo coletivos, mas, se tal ma éria fosse objeto de sentença normativa, a competência seria da Justiça do Trabalho.
Em arrimo a essa tese, o Superior Tribunal de Justiça, corte competente para conhecer, processar e julgar conflitos entre juízes vinculados a tribunais diversos (artigo 105, I, d, da CF/88), expediu a Súmula -n? 57, que dispõe: "Compete à Justiça comum estadual processar e julgar ação de cumprimento fundada em acordo ou convenção coletiva não homologada pela Justiça do Trabalho".
Porém, em 8 de fevereiro de 1995 foi publicada a Lei no 8.984, promulga no dia anterior cujo artigo 1 0 dispõe competir à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios que tenham origem no cumprimento de convenção coletiva de trabalho ou acordo coletivo de trabalho, mesmo -quando ocorrem entre sindicatos ou entre Sindicatos de trabalhadores e empregador. Noutro falar, essa lei estendeu a competência da Justiça do Trabalho para abranger os direitos relativos ao cumprimento de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, ainda que dissessem respeito a sindicatos.
De trabalho, Interpretação do artigo 114 da Constituição Federal. Distinção entre lacuna da lei e 'silêncio eloquente' desta.
Ao não se referir ao artigo 1 1 4 da Constituição, em sua parte final, aos litígios que tenham origem em convenções ou acordo coletivos, utilizou-se ele do 'silêncio eloquente', pois essa hipótese já estava alcançada pela previsão anterior do mesmo artigo, ao facultar à lei ordinária estender, ou não a competência da Justiça do Trabalho a outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, ainda que indiretamente.
Em consequência, e não havendo lei que atribua competência à Justiça Trabalhista para julgar relações jurídicas como a sob exame, é competente para julgá-la a Justiça comum.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
E tanto nesse sentido se firmou a orientação do Tribunal que sequer se pôs em dúvida a constitucionalidade da Lei no 8.984/95, que se valendo da autorização constitucional — veio efetivamente a transferir para a Justiça do Trabalho a competência para julgar 'os dissídios que tenham origem no cumprimento de convenções coletivas de trabalho ou acordos coletivos de trabalho, mesmo quando ocorram entre sindicatos de trabalhadores e empregador,'.
Ao contrário, deu-se à lei nova aplicação imediata, abrangendo os processos em curso (RE no 140.341, 2a Ti Velloso, 2.4.96, RTJ 164/314; RE no 131.096¶1 a T, Moreira, 1 1.4,95, DJ 29.9.95).
De tudo se extrai, com peso decisivo na espécie que — antes e depois da lei que confiou à Justiça do Trabalho a decisão das controvérsias delas oriundas — as cláusulas de desconto pelo empregador de contribuições sindicais foram tidas pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como 'resultantes da relação de trabalho' e, pois — como, de resto, é de longa tradição —sus- e Sindical Instituídas por Convenção Cœ letivo (Sic) de Trabalho. Lei nq 8.984/95, Precedentes do STJ.
1 . Conflito conhecido, eis que figuram na relação processual juízes vinculados a Tribunais diversos (art. 105, inciso l, alínea d, da CF/88).
2 Compete à Justiça do Trabalho o processamento e o julgamento de dissídios que tenham origem no cumprimento de convenções coletivas ou acordos coletivos de trabalho, mesmo que ocorram entre entes sindicais ou entre sindicatos de trabalhadores e empregadores. Aplicação do art 1 0 da Lei no 8.984, de 2 de julho de 1995, em perfeita consonância com o disposto no art. 1 1 4 da Constituição Federal.
3 Precedentes do STJ.
4 declarado competente a julgar a presente ação de cumprimento de sentença normativa O Juízo da 1 Vara do Trabalho de São Paulo/SR" (STJ, 1 Seção, CC no 34605/9, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ.
Em seu voto, destacou a ilustre Relatora:
No mérito, cabe ressaltar que é firme e reiterada a jurisprudência desta Corte no sentido de ser competente a Justiça do Trabalho para julgar a controvérsia.
De fato, a Lei no 8.984/95, na conformidade da permissão contida no art. 114 da Constituição Federal, alargou a terciada Justiçado Trabalho, cabendo-lhe, agora, além de tutelar as relações entre trabalhadores e empregadores, conciliar e julgar os dissídios coletivos decorrentes do cumprimento de convenções coletivas ou acordos coletivos de trabalho, mesmo que estes ocorram entre sindicatos.
É o que está expresso no art. 1 0 da legislação ordinária em comento, in verbis.
Art. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios que tenham De logo se observa que a Lei em comento passou a admitir expressamente a possibilidade de ação de cumprimento de convenção ou acordo coletivo de trabalho, levando, inclusive, o TST a modificar o Enunciado no 2868.
Embora algumas vozes ilustres propugnem pela inconstitucionalidade da mencionada lei, o Supremo Tribunal Federal jamais a declarou, pelo contrário, em diversas ocasiões afastou sua pretensa inconstitucionalidade, asseverando que a Lei no 8.984 é justamente a norma de que trata o artigo 114 da Constituição Federal ao atribuir competência à Justiça do Trabalho para outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Nesse sentido:
Ementa.l "1 REI prequestionamento mediante embargos de declaração (Súmula no 356): descabimento para suscitar tema constitucional antes não aventado,
II — Convenção coletiva de trabalho: validade de cláusula que Obriga os empregadores ao desconto de contribuição confederativa aprovada em assembleia geral da categoria profissional e competência da Justiça do Trabalho para as ações dela decorrentes (STE RE no 287.227-0/9, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 2.3.01
Vale a pena transcrever O trecho final do voto do eminente Relator, que, após mencionar discordância do Ministro Gallotti com entendimento que defendera em outra ocasião, assim se pronunciou: ccc...)
Mas, na mesma data, o mesmo posicionamento que assumira veio a ser igualmente abraçado no RE no 130.555, 4.6.91 , rel. o em. Ministro Moreira Alves, cuja ementa assinala - RTJ 139/965:
'Conflito de competência, Litígio entre sindicato de empregados e empregadores sobre o recolhimento de contribuição esticeptÍveis de estipulação em convenções ou acordos coletivos de trabalho.
Por seu caráter elucidativo, convém trazer à baila, dentre tantos outros, um julgado do Superior Tribunal de Justiça, fundado em inúmeros precedentes dessa Corte que já fizeram com que fosse superado o entendimento cristalizado na Súmula no 57, embora esta não tenha ainda sido formal' mente cancelada, Eis o teor da ementa:
"Conflito de competência — Ação de cumprimento de sentença normativa pulada em convenção ou acordo coletivoò Sindicato Contribuição Assistencial origem no cumprimento de convenções coletivas de trabalho ou acordos coletivos de trabalho, mesmo quando ocorram entre sindicatos de trabalhadores e empregador.'(..a) "
E nesse mesmo julgado, dando continuidade a seu voto, a douta Ministra Relatora lançou mais luzes sobre a questão, esclarecendo que:
Ademais, impende ressaltar que o critério para definição da competência, nessas demandas que versam sobre valores devidos a entidades profissionais, decorre da natureza das contribuições vindicadas, ou Seja, se o pleito envolve contribuição sindical, instituída em lei, a competência será da Justiça comum. Por outro lado, quando se postula o pagamento de contribuições estabelecidas em convenção coletiva, como é a hipótese dos autos, não resta dúvida de que a Justiça Trabalhista é indicada para processar e julgar o feito. (...) "
De fato, tais fundamentos justificam a adoção da Súmula no 222 do Superior Tribunal de Justiça: "Compete à Justiça comum processar e julgar as ações relativas à contribuição sindical prevista no art. 578 da CLT".
Como visto, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, com o advento da Lei no 8.984/95, passaram a reconhecer, reiteradamente, a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento das ações de cumprimento que objetivam o recolhimento de contribuições assistenciais previstas em convenções ou acordos coletivos de trabalho.
No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, a Resolução no 59/96 cancelou o Enunciado no 334, que havia revisto o de no 224 e que estabelecia a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar açöes de cumprimento nas quais o sindicato pleiteasse o recolhimento de desconto assistencial previsto em convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Não obstante, alguns julgados dessa Corte trabalhista têm declarado a incompetência da Justiça do Trabalho para tais ações, Nesse sentido:
"Incompetência — Justiça do Trabalho
Ação de cumprimento — Lei no 8.984/95 '-a Contribuições Assistenciais Previstas em norma coletiva, A Lei no 8.984/95 não atribui competência à Justiça do Trabalho para apreciar ação de cumprimento proposta por sindicato patronal em face de empresa por ele representada, mediante a qual pretende o sindicato o pagamento de contribuição assistencial estipulado em norma coletiva, por se tratar de disposição alheia a normas e condições de trabalho, que se insere na órbita do direito privado". (TST, RR no 14/2002.900.04.00-5, 5a T, Rel. Min. João Baptista Britto Pereira).
"Incompetência da Justiça do Trabalho — Ação de cumprimento — Contribuição assistencial — Previsão em norma coletiva. A contribuição assistencial da Empresa-Reclamada em favor do Sindicato Patronal, que não envolve os empregados ou o sindicato profissional, afetando exclusivamente o interesse da entidade beneficiada, não constitui condição normativa de trabalho, ou seja, não cria condições de trabalho para a categoria sindicalizada. Não obstante a eventual identidade de conteúdo e de eficácia substancial entre as convenções ou acordos coletivos de trabalho (artigo 61 1 e § 1 0 da CLT) e a sentença normativa (artigo 867 da CLT) ou de homologação de acordo em dissídio coletivo (artigo 863 da CLT), os primeiros não configuram decisões da Justiça do Trabalho e, por isso, os litígios neles fundados entre Sindicato patronal e empregados não se enquadram no âmbito da competência que lhe confere a parte final do artigo 1 14 da Constituição da República. Recurso de revista não conhecido." (TST — RR nO 52063/2002.900.04-00, 3a T, Rel. Min. Carlos Alberto R de Paula, DJ 19.12.02)
Quer nos parecer bastante restritivo a tese consagrada nesses julgados do colendo Tribunal Superior do Trabalho, sobretudo quando o Superior Tribunal de Justiça e o próprio Supremo Tribunal Federal já se pronunciaram sobre a competência da Justiça do Trabalho a respeito dessa questão.
LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA
Sobre esse ponto, asseverou Emílio Gonçalves 10 : "A ação de cumprimento pode ser promovida por um empregado (reclamação individual singular), por mais de um empregado — não havendo número determinado de empregados — desde que a matéria seja a mesma (reclamação individual plúrima) ou pelo sindicato da categoria profissional, em nome próprio, na defesa dos interesses dos empregados os quais devem Ser mencionados e qualificados na inicial, independentemente da expressa outorga de poderes (substituição processual).
Adverte, contudo, o douto Juiz do Trabalho Cláudio Armando Couce de Menezes": "Cláusulas de Interesse exclusivo do sindicato (descontos e multas em seu favor) afastam, obviamente, o interesse e a legitimidade do empregado".
Lembra ainda, o mencionado articulista, que: "A substituição processual, consagrada ao sindicato pela Lei no 8.073/ 90 e pela própria Constituição (art. 80, III), abrange os integrantes da categoria profissional e não apenas 0$ associados, malgrado o que disposto no art. 872 da CLT"12fde forma que, aderindo ao seu posicionamento, acreditamos desnecessária a qualificação na inicial dos empregados substituídos, conforme, aliás, defende Wagner GigIi. Na verdade, não vemos razão lógica para que não possa a apuração dos beneficiários da condenação ser feita em liquidação do julgado. Sucede algo semelhante ao se identificar, através de ações individuais, os trabalhadores aos quais aproveita a norma coletiva, consignada nas decisões normativas. Nada além do injustificado apego à tradição jurídica ultrapassada pelos imperativos da evolução nada impede que essa identificação seja feita nos autos da mesma ação, na fase de liquidação, com reais benefícios para a celeridade processual".
Entrementes, e apesar de o próprio Supremo Tribunal Federal já ter se manifestado no sentido de que o art. 80, III da ÇF/88 conferiu às entidades sindicais substituição processual ampla e irrestrita o Tribunal Superior do Trabalho expediu o Enunciado no 310, que exige em seu item V a individualização dos substituídos.
Finalmente, também entendemos como legitimado a ajuizar ação de cumprimento á associação de empregados, atuando porém, como representante processual, posição defendida com fundamento nos arts. 50, XVII XVIII, XIX, XXI e 80, caput, da CF/88*
Legitimado passivamente é o empregador (art. 872, parágrafo único, da CLT). A Lei no porém, dá ensejo a que o sindicato figure como reclamados.
OUTRAS QUESTÕES PROCESSUAIS E PROCEDIMENTAIS
Já se disse alhures que não é condição para a ação de cumprimento o trânsito em julgado da decisão normativa, podendo ser ajuizada a partir do 200 (vigésimo) dia subsequente ao julgamento, fundada no acórdão ou na certidão de julgamento. Aliás, a possibilidade de seu ajuizamento sem o trânsito em julgado da sentença normativa já era reconhecida pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, cristalizada no Enunciado no 246: "É dispensável o trânsito em julgado da sentença normativa para propositura da ação de cumprimento".
Como ação trabalhista comum, a ação de cumprimento não possui rito especial. A inicial deverá ser instruída com a certidão da decisão coletiva (art. 872, parágrafo único), admitindo, a jurisprudência, outro documento idôneo que a substitua, como o exemplar do órgão oficial que publicou a decisão normativa ou a cópia autenticada da mesma. Tratando-se de documento indispensável à propositura da ação, a inobservância da Lei, no particular, acarreta a extinção do processo sem julgamento do mérito. Pertinente, contudo, a aplicação do art. 284 do CPC, devendo o juiz assinar o prazo de IO dias para a emenda da inicial e só então indeferir a petição inicial, caso não cumprida a diligência.
A audiência de instrução e julgamento na açäo de cumprimento não difere da audiência nos dissídios individuais, ressalvadas, porém, as restrições feitas à possibilidade de o sindicato, atuando como substituto processual, conciliar nos autos, renunciando direitos. Com efeito, a doutrina tem entendido que o sindicato, atuando em reclamações individuais como substituto processual, não pode renunciar a direitos dos substituídos.
Nesse particular, tornam-se mais uma vez pertinentes os judiciosos ensinamentos dê Mozart Victor Russomano, apud Emílio Gonçalves, ao comentar o art, 843 da CLT: "A norma em exame parece autorizar o sindicato a aceitar ou recusar a conciliação proposta em audiência. Se isso é lógico -nas ações coletivas, quando estão em jogo interesses gerais e abstratos da categoria, que tem no sindicato seu único e exclusivo porta-voz, já o mesmo não é plausível nas ações individuais, quando se equacionam prerrogativas particulares e concretas, com titulares perfeitamente identificados que devem ser ouvidos, previamente, na celebraçäO de qualquer acordo que represente desfalque ou subtração de suas pretensões em juízo,".
No mesmo sentido é a lição de Valentin Carrion: "No processo laboraç não tendo o legislador proibido a intervenção do titular para aditar, desistir ou conciliar a ação proposta pelo sindicato, não se lhe pode negar a disponibilidade de direito material; há prevalência de sua vontade, em conflito com o sindicato, e do direito de escolha de advogado, face a sua subordinação à coisa julgada; mesmo porque prevalece o concreto sobre o abstrato. Ainda mais que, não podendo o substituto pactuar acordo, frustra o instituto da conciliação, que é uma constante no procedimento trabalhista, desde a Constituição Federal à lei ordinária".
Ao restringir o âmbito de cognição da ação de cumprimento, a lei também impõe certas limitações à defesa do reclamado, na medida em que veda a discussão sobre a matéria de fato e de direito já apreciada na sentença normativa.
Contudo, o reclamado pode alegar não enquadrar-se no âmbito de representação do sindicato suscitado, ou o não-enquadramento de seus empregados no âmbito de representação do sindicato profissional suscitantei6. Pode pedir a compensação ou a retenção, em razão de ter feito adiantamentos dos reajustes fixados no instrumento normativo ou ter atendido, parcialmente, algumas vantagens nele instituídas. Pode sustentar sua incapacidade econômica em arcar com o reajuste salarial ou com a nova condição de trabalho, desde que tal matéria não tenha sido apreciada na sentença normativa, ou se a incapacidade é superveniente à sentença normativa. Além disso, pode opor defesa de natureza processual. Quando o sindicato atua como substituto processual, não se admite a reconvenção, em razão do disposto no art. 315, § 10, do CPC.
A prescrição também pode ser argüida como matéria de defesa, havendo certo debate doutrinário a respeito do dies a quo do prazo prescricional para pleitear, na ação de cumprimento, os direitos decorrentes da sentença normativa, Alguns entendem que o prazo prescricional tem início do momento em que se tornam exigíveis as condições previstas na norma coletiva, o que ocorre com sua publicação, já que o Enunciado n 0246 do TSTdispensa o trânsito em julgado para a propositura da açã0J20 Outros advogam que o prazo prescricional só começaria a fluir com o trânsito em julgado da decisão normativa, uma vez que a possibilidade de seu ajuizamento antes desse fenomeno processual (transito em julgado) é mera faculdade atribuída pela Lei aos empregados ou ao seu sindicato (Lei no 4.725/ 65 e Enunciado no 246/TST). No Tribunal Superior do Trabalho prevaleceu O segundo entendimento, tendo esta Corte expedido o Enunciado no 350: "O prazo prescricional em relação à ação de cumprimento de decisão normativa flui apenas a partir da data de seu trânsito em julgado". (Resolução no 62, de 26.9.96.).
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, que durante algum tempo consagrou o entendimento no sentido de que eram devidos os honorários advocatícios quando o sindicato figurasse como substituto processual, desde que atendidos os requisitos da Lei no 5.584/70 (Enunciado n o 220/TST, cancelado pela Resolução n o 55/96), atualmente posiciona-se em sentido contrário (Enunciado no 310, inciso VIII).
Por fim, convém trazer à baila, uma questão interessante, em razão da possibilidade de ajuizamento da ação de cumprimento sem o trânsito em julgado da sentença coletiva: se a decisão normativa que ensejou o aviamento da ação de cumprimento for modificada em grau de recurso, extirpandose do mundo jurídico a cláusula constante na sentença que previa o reajuste, quais as conseqüências na ação em curso. Sobre o assunto, Cláudio Armando Couce de Menezes aduziu:
"Aqui cabe ponderar que a sentença proferida em ação de cumprimento é considerada como sujeita à condição resolutiva (art. 199 do Código Civil). Daí que, se verificado o evento futuro e incerto, o provimento do apelo ou o acolhimento da rescisória, as vantagens percebidas e usufruídas pelo trabalhador perdem sua razão de ser, retornando-se ao status quo ante. A tanto autorizam a concluir os arts. 462, 471 e 572 do CPCe 873 876 da CLT.
A modificação da sentença condenatória proferida na ação de cumprimento pode ser efetivada no próprio processo se ainda não operada a coisa julgada, na forma do art. 462 do CPC. A alteração após este marco empolga a ação de revisão, conforme permissão do art. 471 , l, do CPC"'.
Na hipótese final aventada (alteração da sentença condenatória na ação de cumprimento após seu trânsito em julgado) Estevão Mallet defendeu o cabimento dos embargos à execução como meio idôneo para o pedido de revisão da sentença condenatória, o que achamos perfeitamente admissível.