Atuação do ministério público do trabalho como árbitro

Por: Janguiê Diniz
01 de Abr de 2004

"Não padece qualquer dúvida sobre a uniformidade de pensamento tanto doutrinária quanto jurisprudencial acerca da admissibilidade da arbitragem como forma de solução dos conflitos coletivos de trabalho no Brasil." "Tanto os empregados como os empregadores teriam, durante todo o processo, o respaldo jurídico de seus sindicatos. Os direitos discutidos nestas ações coletivas são, na maioria das vezes, disponíveis e passíveis de negociação, como no caso de revisão periódica de salário."

A tese defendida revela a possibilidade da utilização da arbitragem por parte do Ministério Público do Trabalho para resolver os conflitos laborais, vez que as formas alternativas como a mediação, a conciliação e em especial a arbitragem são cada dia mais valorizadas pelo legislador, doutrinadores e pela jurisprudência trabalhista.

Após anos de enclausuramento democrático e político, vivendo um regime de exceção repulsivo e castigante, passamos a respirar novos ares. A sociedade brasileira está, definitivamente, na "Era dos Direitos", expressão consagrada pelo saudoso filósofo Norberto Bobbio. As pessoas se indagam diariamente: será que posso? Por que não posso? Como faço para conseguir? Como obter de forma mais rápida? Será que vale a pena? Estamos aprendendo a lutar pelos nossos direitos, mas um obstáculo ainda atravessa o caminho da consolidação definitiva dessa nova mentalidade: a irritante e ineficiente demora da prestação jurisdicional.


No que diz respeito aos conflitos individuais trabalhistas, travados entre patrões e empregados, presenciados diariamente aos milhares nos juízos e tribunais competentes, a situação não é outra. No entanto, esse quadro endêmico é reversível: baseado nesta busca de soluções à falência inconteste do atual modelo jurisdicional, o professor Janguiê Diniz defendeu recentemente, na UFPE, tese de doutoramento intitulada "Atuação do Ministério Público do Trabalho como árbitro nos Dissídios de Competência da Justiça do Trabalho", revelando a possibilidade da utilização da arbitragem por parte do Ministério Público do Trabalho para resolver os conflitos laborais. Nela, ele advoga a utilização de soluções extrajudiciais como alternativa na resolução dos conflitos sociais, vez que as formas alternativas como a mediação, a conciliação e em especial a arbitragem são cada dia mais valorizadas pelo legislador, doutrinadores e pela jurisprudência trabalhista.


Revista Jurídica CONSULEX - Professor Janguiê Diniz é possível a utilização da arbitragem para resolver conflitos trabalhistas?
José Janguiê Diniz — Não padece qualquer dúvida sobre a uniformidade de pensamento tanto doutrinária quanto jurisprudencial acerca da admissibilidade da arbitragem como forma de solução dos conflitos coletivos de trabalho no Brasil, porque tanto os empregados como os empregadores teriam, durante todo o processo, o respaldo jurídico de seus sindicatos. Os direitos discutidos nestas ações coletivas são, na maioria das vezes, disponíveis e passíveis de negociação, como no caso da redução ou não da jornada de trabalho dos empregados e no caso de revisão periódica de salário, tão utilizada nas transações entre sindicatos de patrões e de empregados, mormente em razão do disposto no art. 114, §§ 1 0 e 20 da Constituição da República. Entretanto, o mesmo não se pode dizer quanto à aplicação da arbitragem para a composição dos conflitos individuais de trabalho, pois não há communis opinium doctorum, nem tampouco consensus omnium jurisprudencial, reinando viva controvérsia.


Os contrários enfatizam não ser possível ao argumento de que: 1) indisponibilidade e irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas que os colocaria fora do âmbito de incidência da arbitragem, por força do art. 1 0 da Lei no 7.307/96; 2) omissão da lei; 3) custo alto da arbitragem, etc. Ora, de fato, os entendimentos doutrinários acerca da admissibilidade da arbitragem em dissídios individuais laborais discrepam entre si. Contudo, verifica-se, paulatinamente, que a facúndia dos defensores da admissibilidade ganha terreno. No particular, até por amor à consciência engrossamos os componentes desta fileira.


Quanto à indisponibilidade, esta variará em função da época contratual em que é proferida, e em função da abrangência e substância do direito renunciado. Quanto à época propícia, a renúncia a direitos pode ocorrer na celebração do contrato de trabalho, durante sua vigência, na rescisão contratual ou posteriormente a esta rescisão. A indisponibilidade no ato da contratação decorre da irrenunciabilidade, protegendo a parte que esteja em situação de hipossuficiência, o mais fraco: o empregado, já que este encontra-se em situação de vulnerabilidade. Porém, não devemos tratá-la como uma presunção absoluta.


Nem todos os empregados encontram-se afligidos pela possibilidade fragilizadora do desemprego, principalmente quando se tratar de empregado qualificado, que troca de emprego em busca de melhores e crescentes condições financeiras. Entretanto, durante a vigência do contrato, poderia, sim, ocorrer a fragilidade do trabalhador, principalmente se a oferta de mão-de-obra for maior que a demanda por empregados, o que acarreta o risco do desemprego. Parte-se de uma presunção de que enquanto perdurar o vínculo do contrato de trabalho, além de subordinado a seu patrão, o trabalhador, na maior parte dos casos, dele dependerá economicamente, situação que o coloca em contínuo estado de coação, invalidando atos jurídicos renunciadores de direito, por parte do empregado.


Já na rescisão do contrato de trabalho, ou após a mesma, não há que se falar em irrenunciabilidade ou indisponibilidade, pois o empregado não dependerá mais do empregador, não se subordinando a seus ditames. Despiciendo o argumento de que os direitos trabalhistas são tratados em normas cogentes e de ordem pública, haja vista que "nem todas as normas trabalhistas são de ordem pública e imperativas e, por conseqüência, indisponíveis os direitos. Boa parte das normas alusivas ao contrato de trabalho são dispositivas. Esta disponibilidade existe porque o direito é privado e patrimonial, sendo igualmente privado o interesse tutelado pela norma. Registre-se que até o salário contratual está sujeito à disposição, art. 70, inciso VI, da CF. Isso implica dizer que o irrenunciável é o mínimo legal, o que passar pode ser renunciado. Ademais, todos os outros direitos são objeto de transação em Juízo notadamente quando já encerrado o vínculo de emprego". Logo, é hora de assumirmos, sem hipocrisias, que os direitos trabalhistas não são irrenunciáveis.


A transação judicial, tão defendida pelos magistrados, responsável pela solução de 90% dos conflitos trabalhistas consiste em quê? O próprio Direito Processual do Trabalho agasalha amplamente a conciliação e conciliar envolve a renúncia de direitos. Com efeito, se o trabalhador pode renunciar seus direitos em juízo, por que não pode fazê-lo perante árbitros livremente escolhidos entre ele e seu ex-empregador? A indisponibilidade dos direitos trabalhistas possui, portanto, significado bastante relativo, não servindo de fundamento válido para afastar a possibilidade do uso da arbitragem na solução dos dissídios individuais trabalhistas.


Quanto à omissão da lei acerca da arbitragem trabalhista, cumpre registrar que no âmbito do Direito do Trabalho a arbitragem vem tendo atenção específica desde o início do sécuIo passado, com o advento do Decreto no 1.073, de 05.01.1907, que tratava da arbitragem feita pelos sindicatos. A Lei de Greve no 7.783/89 condiciona a legitimidade do movimento paredista à frustração de todas as possíveis tentativas de negociação coletiva e à impossibilidade do recurso à arbitragem.


Por sua vez, a Lei no 8.630/93, organizadora dos serviços portuários, dispõe também sobre a arbitragem no Direito do frabalho. Por outro lado, a Lei no 10.101/2000 que regulamentou a participação nos lucros e resultados das empresas, possibilita o uso da arbitragem quando houver impasse na negociação coletiva a respeito da quota de participação dos empregados nos lucros.


Ademais, em que pese a inexistência de norma específica do Direito Processual do Trabalho disciplinando a matéria, a aplicação da Lei no 9.307/96 aos dissídios trabalhistas se dá por força do disposto no art. 769 da CIT, que assegura a incidência do Direito Processual comum nos casos de omissão do Direito Processual do Trabalho, ressaltando que os preceitos contidos na citada lei podem perfeitamente compatibilizar-se com o processo trabalhista. E, por fim, a própria CF/88, art. 114, e 2 0 c/c com o art. 83, inciso XI, da Lei Complementar no 75/ 1993 tratam da arbitragem.


No que concerne ao argumento de que o custo da arbitragem é alto, cumpre mostrar que enquanto na Justiça do Trabalho o custo médio de um processo, sem interposição de recursos, gira em torno de R$ 2.000,00 (dois mil reais); no procedimento arbitral este valor gravita nos R$ 130,00 (cento e trinta reais), geralmente pagos pela empresa, conforme se estipulam em dissídios coletivos. Ademais, nada impede às convenções ou acordos coletivos de trabalho ratearem estes custos com os sindicatos patronais e obreiros ou entre as empresas e os sindicatos obreiros, de modo que o empregado não tenha que arcar com as despesas do procedimento. E, conforme veremos adiante, se a arbitragem for ministerial ela será gratuita.


CONSULEX — Em que argumentos o senhor se baseia para defender o MPT como árbitro?
Janguiê Diniz —Atualmente estamos vivendo a "Era dos Direitos Sociais", segundo o jusfilósofo Norberto Bobbio. Para ele, o problema grave do nosso tempo, com relação aos direitos do homem, não é mais o de fundamentá-los, e sim o de protegê-los. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados. Logo, o problema não é filosófico, mas jurídico e político. Com efeito, após anos de enclausuramento democrático e político, vivendo um regime de exceção repulsivo e causticante, passamos a respirar novos ares. Com isso, passa a sociedade brasileira por um momento de mudanças e reavaliação de seu patrimônio de direitos. Estamos descobrindo e aprendendo a lutar por nossos direitos.


Aliado a isso, temos que alguns institutos e instituições encontram-se revigorados com estes novos ares, livres do sufoco antidemocrático e irracional do passado. Todavia, uma instituição e um instituto se nos mostram com incalculáveis bons reflexos à efetividade de nossos direitos, mormente com a novel posição jurídica de nosso ordenamento. São elas: o Ministério Público, em especial, o Ministério Público do Trabalho, e a solução de conflitos por métodos extrajudiciais, em especial, a arbitragem trabalhista.


No que concerne ao Ministério Público, este hoje se apresenta como autêntico advogado da sociedade, defendendo os interesses sociais, assim entendendo como difusos e coletivos em sentido amPIO. É titular da ação que se fizer necessária para proteger o que é de todos.


O órgão ministerial insere-se dentre os órgãos da Administração Pública, contudo em posição especial, como órgão essencial à função jurisdicional do Estado, resultante de suas funções na tutela da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, promovendo, fiscalizando, combatendo e opinando. O Ministério Público cuida de garantir, nas áreas que a lei determina, o interesse geral, o que é de todos.


Nesse contexto, desde a Carta de 1988, coube ao Ministério Público, em especial ao Ministério Público do Trabalho orientar suas atividades para alcançar os fins almejados pela sociedade, sempre norteado pelo princípio constitucional da independência funcional pelo qual o membro do Parquet tem total liberdade para exercer o seu mister sem o dever de submissão a outra instituição ou a qualquer membro, salvo o respeito às normas existentes.


No tocante à arbitragem, não é instituto recente. Recente é sua regulamentação em vigor, a Lei no 9.307/96, promulgada em 1996. Todavia, já antes desta Lei, chamada de Marco Maciel, outros diplomas legais a regularam.
A Constituição da República no artigo 114, parágrafos 1 0 e 20, elegeu a negociação coletiva e a arbitragem como meios de solução dos conflitos trabalhistas.


Ademais, foi sob a égide de nosso Código de Processo Civil de 1973, arts. 1.072 a 1.102 atinentes à arbitragem (posteriormente revogados), que entrou em vigor a Lei Complementar no 75/93, dispondo sobre a organização e o funcionamento do Ministério Público da União, e, em particular, o Ministério Público do Trabalho.


Observe-se, portanto, que a atuação do MP como árbitro é anterior à nova Lei de Arbitragem — Lei no 9.307/96, logo, essas atividades já vinham sendo desempenhadas pelas Regionais Trabalhistas em todo o território nacional".


Como se vê do didatismo inteligente do art. 83, inciso XI, da Lei Complementar no 75/93, "compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: (...) XI — atuar como árbitro, se assim for solicitado pelas partes, nos dissídios de competência da Justiça do Trabalho".


Em procedendo à hermenêutica mais razoável do preceptivo antes transcrito, deflui-se que algumas características já se denotam com facilidade de compreensão: 1) que o Ministério Público do Trabalho pode atuar como árbitro nos dissídios de competência da Justiça do Trabalho de qualquer natureza, seja coletivo ou individuais desde que solicitado pelas partes; 2) que essa arbitragem ministerial é facultativa e voluntária.


Por outro lado, o Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho promulgou a Resolução no 44, regulamentando a arbitragem ministerial. Este instrumento normativo, em suma, repete as disposições legais e constitucionais relativas à matéria, sendo devido ressaltar apenas a inovação de seu art. 30, que trata da iniciativa e da distribuição do procedimento arbitral.


Veja-se que nem a Lei Complementar no 75/93 nem a Resolução no 44 ao se referir à atuação do Ministério Público do Trabalho como árbitro em nenhum momento fez distinção entre dissídios individuais de coletivos.


Ora, o que alei não proíbe ou distingue, não cabe ao intérprete proibir ou distinguir, segundo as mais regras de hermenêutica. E nem se diga que o artigo 83, inciso XI, da Lei Complementar no 75/93, é inconstitucional, haja vista que o legislador constituinte não proibiu. Ao se manifestar com relação à esfera coletiva, a Constituição Federal apenas realçou a possibilidade de os sindicatos recorrerem à arbitragem quando frustrada a negociação (art. 114, § 10). Doutra parte, em nenhum momento o STF declarou de forma direta a inconstitucionalidade do presente instituto normativo. E, como é sabido, qualquer lei em vigor presume-se constitucional até que a Corte Suprema a declare inconstitucional se for o caso.


CONSULEX - Segundo a CE 0 Ministério Público só deve atuar em existindo interesse público. Como superar essa questão?
Janguiê Diniz — De fato, a questão nos remete a uma discussão mais profunda acerca do que venha a ser interesse público a justificar a intervenção do Ministério Público do Trabalho nessas demandas.


O CPC, em seu art. 82, trata das hipóteses de intervenção do Ministério Público, dispondo que: "Art. 82. Compete ao Ministério Público intervir: I) nas causas em que há interesses de incapazes... III) e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte".


No particular, importa registrar que não existe consenso doutrinário acerca da definição de "interesse público". Para uns "seriam aquelas aspirações ou vantagens licitamente almejadas por toda a comunidade administrada..." Para outros, ele "identifica-se com o conceito de bem geral, com o interesse da coletividade como um todo".


Logo, a doutrina e a jurisprudência predominante têm se manifestado que o interesse público é aquele concernente a aspirações almejadas por toda a comunidade, identifica-se com o conceito de bem geral, com o interesse da coletividade como um todo, é o pertinente a toda sociedade. E o interesse de todos, não é de ninguém, sobrepondo-se ao interesse privado, não se confundindo com interesse patrimonial de qualquer órgão público. Logo, é sinônimo de interesse geral da sociedade, trata-se do interesse geral (impessoal) que a todos concerne diretamente e não imediatamente ao Estado como sujeito de direito e obrigações, voltado para o desempenho das atividades que lhes são peculiares (interesse puramente administrativo e pessoal).


Vê-se, por ser importante, que à luz do art. 769 da CLT, os incisos I e III do CPC este em sua parte final, aplicam-se ao Processo do Trabalho, de sorte que a atuação do Ministério Público do Trabalho deve se dar nos feitos em que há interesses de incapazes ou interesse público evidenciado pela natureza da lide ou pela qualidade da parte.


Ademais, a Lei Complementar no 75, de 20 de maio de 1993, que instituiu a Lei Orgânica do Ministério Público da União, trata da intervenção do Ministério Público e, em particular, do Ministério Público do Trabalho, vaticina em seu art. 83, inciso II: "— manifestar-se em qualquer fase do processo trabalhista, acolhendo solicitação do juiz ou por sua iniciativa, quando entender existente interesse público que justifique a intervenção;".


O artigo é claro ao conferir ao Ministério Público do Trabalho certo grau de discricionariedade acerca da definição do que seja interesse público que justifique sua intervenção no feito.


Convém esclarecer, por oportuno, que o Conselho Nacional dos Corregedores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União, em seu XXIX Encontro, realizado na Capital Federal no dia 28 dejunho de 2002, expediu um documento intitulado Carta de Brasília, em que deliberou: "4 — reafirmar a Súmula no 5, aprovada no XIII Encontro, realizado na cidade de Canela/RS, em agosto de 1998, no sentido de que na hipótese do inciso III do artigo 82 do CPC, 'o que legitimará a intervenção do Ministério Público será a existência de um interesse público, evidenciado pela natureza da lide ou pela qualidade da parte, reconhecendo-se certa margem de discricionariedade à própria Instituição — e não ao Poder Judiciário — para adotar o conceito de interesse público às situações concretas"'


A toda evidência, o Ministério Público do Trabalho pode e deve atuar perante o Judiciário Trabalhista sempre que entender existente interesse público que justifique sua intervenção (a seu alvedrio, a seu talante). Da mesma forma, poderá atuar como árbitro quando entender existente interesse público que justifique sua atuação. Entretanto, cabe ao Ministério Público do Trabalho, dentro do grau de discricionariedade que a lei lhe confere (art. 82 do CPC e 83, II, da LC no 73/95) definir o que seja interesse público que justifique sua atuação como árbitro, haja vista inexistir definições objetivas acerca do que seja interesse público.


CONSULEX- Como deve O MPT proceder na condição de árbitro?
Janguiê Diniz —Ao atuar como árbitro, deve o MP se pautar apenas pelo procedimento geral da Lei de Arbitragem, ou pelo que for disposto pelas partes litigantes, em sua convenção de arbitragem.
Releve-se a necessidade de uma atuação totalmente diferente do membro do Ministério Público do Trabalho que venha a desempenhar a função de árbitro. Na maior parte dos casos em que atua o Procurador do Trabalho, em seu cotidiano, ele tem uma atitude latentemente repressora e proativa, na defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores, quando desrespeitados se encontrem. Na atuação como árbitro, esta repressão deve ser abandonada, até como forma de não afastar os cidadãos da instituição, principalmente os empregadores. Isto não quer significar ser mais tolerante com X ou com Y, porém, traduz a necessidade do respeito a ambas as partes, e do convite ao respeito mútuo entre as mesmas. E uma atuação que deve estar desprovida de quaisquer animosidades, impedimentos ou suspeições por parte do Parquet. Atuará ele, sempre, de forma serena, participativa, ponderada e razoável, respeitando os princípios materiais e processuais do Direito Comum e do Direito do Trabalho, como os do in dubio pro operario, da primazia da realidade, da continuidade, da condição mais benéfica ao trabalhador, da proteção, etc.

"Cabe ao Ministério Público do Trabalho, dentro do grau de discricionariedade que a lei lhe confere, definir o que seja interesse público que justifique sua atuação como árbitro.


Como o é a arbitragem comum, a trabalhista também deve ser realizada por pessoas aptas, de uma forma especializada, a dirimir questões sob litígio. Contudo, haverá que ser exigido, dos árbitros trabalhistas, além da formação adequada, capacidade e autoridade para equilibrar as desigualdades existentes na relação capital/trabalho, objetivo diuturno da Justiça Trabalhista, sob pena de retrocesso histórico-social — sem precedentes — na proteção dos direitos conquistados arduamente pelos trabalhadores.


Estas observações não devem passar desapercebidas pelos membros do Ministério Público do Trabalho, bem como por seu órgão maior — a Procuradoria Geral do Trabalho —, de modo a não ser aceita, nem imposta a incumbência arbitral quando o Procurador não se sinta preparado para atuar como árbitro, ou não tiver o domínio técnico da matéria sob questionamento. Isto, inclusive, seria motivo de preservação da efetividade da atuação ministerial, elevando a arbitragem ao nível de qualidade e presteza que dela se exige.


"Nos termos do disposto no art. 83, XI, da LC no 75/93, observamos a atribuição conferida ao Parquet para 'atuar como árbitro, se assim for solicitado pelas partes, nos dissídios de competência da Justiça do Trabalho. Aponta o modelo de juízo arbitral adotado pela Lei Orgânica do MPU para a desnecessidade da denominada cláusula compromissória, ou seja, a estipulação expressa em contrato individual ou coletivo quanto à possibilidade de solução da lide mediante arbitragem pelo Ministério Público do Trabalho. Imperioso se faz, tão-somente, a celebração de compromisso arbitral quando, nesse diapasão, abdicam as partes da solução heterocompositiva jurisdicional para se curvarem à heterocompositiva arbitral, também pública, posto que o órgão prolator da decisão se encontra investido de parcela do poder estatal. Logo, é proibido ao MP atuar como árbitro de ofício, pois só poderá "se assim for solicitado pelas partes. Não podemos estimular a paz e o consenso, impondo aos conflitantes a negociação e outros meios extrajudiciais" (Manoel Jorge e Silva Neto).


Em obediência ao princípio da independência funcional dos membros do Ministério Público do Trabalho, não deverão ser impostas limitações ao livre convencimento motivado de cada um dos procuradores que venha a proferir sentença arbitral. Tal princípio — nunca olvidemos — "significa que os seus membros, no desempenho de seus deveres profissionais, não estão subordinados a nenhum órgão ou poder — nem ao Poder Executivo, nem ao Poder Judiciário, nem ao Poder Legislativo, nem tampouco hierarquicamente a qualquer membro, salvo administrativamente — submetendo-se apenas à sua consciência e aos limites imperativos da lei".


De legeferenda, deverão ser instalados ofícios específicos apenas para a realização de arbitragens trabalhistas. Reservar-se-iam as lides arbitráveis trazidas ao Ministério Público do Trabalho somente àqueles que mais se encontrassem preparados para tal. Para isso, deverão ser buscados treinamentos específicos, intentando-se o aperfeiçoamento institucional. Criados, estariam os critérios de competência em razão da matéria no âmbito do Ministério Público do Trabalho.


Não deve ser permitida a recusa de árbitro ministerial, pelas partes em litígio, exceto nas estritas hipóteses do art. 138, I, do CPC (casos de suspeição e impedimento); assim como não deve ser admitida a rejeição, pelas partes, de uma eventual substituição.


Este mesmo raciocínio nos fará admitir que ficará a critério do Ministério Público do Trabalho a nomeação, para atuação arbitral, de um Procurador especificamente treinado para solucionar as lides arbitrais ou um colegiado de Procuradores do Trabalho, sempre em número ímpar. Esta última solução poderia ser implementada, de legeferenda, através de Resolução do CSMPT, para casos específicos, onde as discussões obtivessem uma instrução probatória minuciosa e prolongada.


No particular, se a atividade ministerial é perfeitamente indivisível, como o é a arbitragem trabalhista, poderá nela atuar um colegiado de membros do Ministério Público do Trabalho, e poderão estes membros serem substituídos, na forma prescrita em lei, uns pelos outros, em nome do princípio da indivisibilidade ministerial, faceta do princípio-mor da unidade.


Vale, portanto, sempre lembrar que a competência constitucionalmente estabelecida para atuar como árbitro é da instituição Ministério Público do Trabalho e não de seu membro específico, que venha a atuar em alguma arbitragem.


Atuando como árbitro, o Ministério Público do Trabalho não possui nenhum privilégio processual, como prazos maiores, verbi gratia; de modo que o prazo estipulado nos arts. 11, inciso III e 23 (a sentença deve ser dada no prazo estipulado pelas partes. Se não houver prazo em 6 meses) da Lei no 9.307/96 deverá ser respeitado também pelo órgão ministerial.


Não será necessária a equiparação do art. 17 da Lei de Arbitragem (equiparação do árbitro privado ao funcionário público) porque exercente de função estatal já o é o Procurador do Trabalho, respondendo penalmente por suas ações como todo e qualquer funcionário público, mutatis mutandis. Ademais, no que pertine à responsabilidade civil decorrente da arbitragem, vale relembrarmos que o Procurador do Trabalho poderá responder por perdas e danos causados no exercício de suas funções institucionais, como preleciona o art. 85 do CPC em vigor. Basta que proceda com dolo ou fraude.


CONSULEX- A atuação do MPT; como árbitro, oferece alguma vantagem para o jurisdicionado? Janguiê Diniz — Várias:
1) Registramos, inicialmente, o alto nível técnico e intelectual existente nos quadros do Ministério Público do Trabalho, eis que são os seus membros selecionados mediante rigorosíssimo concurso público de provas e títulos; 2) Para as partes em litígio, não haveria a necessidade de arcarem com as custas de um processo arbitral, como ocorre em entidade da iniciativa privada. O Ministério Público do Trabalho deve atuar como árbitro, quando convidado, sem que seja remunerado para isso, nos termos do disposto no art. 128, § 5 0 , II, a, da Constituição Federal; 3) o Procurador do Trabalho, tendo em vista as atribuições a ele destinadas pelo ordenamento jurídico, não dependerá do Judiciário para decretar determinadas medidas coercitivas ou cautelares, que se façam necessárias em procedimento arbitral por ele coordenado. Com isso, a instrução probatória muito se potencializa, quando a arbitragem estiver a encargo do Ministério Público do Trabalho.


Poderá o Parquet, na medida do caput dos arts. 60, 70 , 80 e 84 da Lei Complementar no 75/93, utilizar-se de determinados procedimentos como, por exemplo: 1) Notificação de testemunhas e requisição de conduta coercitiva, se for o caso; 2) Realização de inspeções e investigações próprias; 3) Ter acesso livre a local público ou privado, respeitada a inviolabilidade domiciliar; 4) Requisitar serviços, temporariamente, à Administração Pública; 5) Requisitar instauração de procedimentos administrativos, acompanhando-os e produzindo provas, etc.
Por essas e outras razões, afirmamos que a atuação do Ministério Público do Trabalho como árbitro se apresenta de primacial importância e relevância por vários motivos, mas, sobretudo: 1) peIas relevantes qualidades que detém: 2) conhecimento técnico da matéria; 3) proximidade com o conflito; 4) prestígio e confiança das partes, entre outros. Ademais, 5) inexistiria custo para as partes ao submeter o conflito para a solução arbitral do Ministério Público do Trabalho.

Vedar ao Ministério Público do Trabalho a atuação como árbitro nos dissídios individuais constitui entendimento que se contrapõe ao crescente prestígio da Justiça do Trabalho — órgão jurisdicional perante o qual atua o Parquet trabalhista — e ao próprio processo de interiorização do Órgão Ministerial, anseio de toda a sociedade, que luta por melhores condições de trabalho e pelo respeito à dignidade do trabalhador, objetivos para os quais concorre a atuação do Ministério Público do Trabalho.


Com efeito, no contexto histórico em que hoje vivemos, adquire relevância ímpar a arbitragem trabalhista feita pelo Ministério Público do Trabalho, naquilo que for de competência da Justiça Laboral. Quer-nos parecer que, cada dia mais, o Ministério Público do Trabalho vai adquirindo a confiança de toda a sociedade, em busca da consecução de seus fins institucionais.


Desta maneira, a junção destes dois fatores de recrudescimento do acesso e efetividade da prestação jurisdicional é inolvidável e inarredável — verdadeira estrada sem retorno —, demonstrando que qualquer pensamento doutrinário ou jurisprudencial que venha a se pronunciar de forma contrária, certamente, estará se posicionando agressivamente contra os interesses dos trabalhadores, a partir do momento que renega todas as benesses trazidas peIas legislações arbitral e ministerial, enaltecidas por inúmeros progressistas e bem-aventurados estudiosos de nosso Direito.

Transformando

Sonhos em Realidade

Na primeira parte da minha autobiografia, conto minha trajetória, desde a infância pobre por diversos lugares do Brasil, até a fundação do grupo Ser Educacional e sua entrada na Bolsa de Valores, o maior IPO da educação brasileira. Diversos sonhos que foram transformados em realidade.

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