A palavra conflito etimologicamente vem do latim, conflictu. Socorremo-nos do Aurélio para asseverar que o termo significa: desavença, luta, combate, guerra, colisão, choque, contenda, controvérsia, disputas, litígios, dissídios, etc.'".
Com o fortalecimento dos Estados, os conflitos passaram a ser solucionados pelos Tribunais, que ainda presumia ser de origem divina. A tutela jurisdicional, como ocorre hoje, passou a existir quando o Estado conseguiu libertar-se dos vínculos que tinha com a igreja, corn o sobrenatural. Hoje, portanto, os conflitos de trabalho que surgem das lutas de classes, que existem desde as primeiras fases da civilização humana, mas que só a partir dos Últimos
Cumpre ressaltar, no contexto, que em tempos imemoriais os conflitos eram solucionados através da "justica da mão própria", que consistia numa solução rápida dos conflitos através de "vias de fato", com a vitÓria do líder, do mais forte sobre o mais fraco, e era o que chamamos de autotutela ou autodefesa. Ao depois, corn o surgimento das associações humanas, corn a consequente transformação em cidades, surgiu a "justiça privatista"), como é o caso das revoltas, das sublevações, das guerras, época em que a autocomposição que pode ser entendida como desistência, submissão e transação, ganhou vigor.
Com a evolução das associações humanas, surgiram os primeiros estados, "com a criação de uma classe nobre dirigente e de uma plebe dirigida". Os conflitos, nessa época, passaram a ser solucionados através da arbitragem, na maioria das vezes realizada pelos sacerdotes, que tinham proteção divina, e pelos anciãos, em face de suas experiências(4).
A guisa de ilustração, de se ressaltar que no Direito Romano, a figura do pretor preparava a ação, "primeiro mediante o enquadramento na Ka° da lei, e, depois, acrescentando a elaboração da forma, como se ye na exemplificação de Gaio, e, em seguida, o julgamento por urn iudex ou arbiter, que não integrava o corpo funcional romano, mas era simples particular idôneo, incumbido de julgar..."
Conferência proferida no seminário "A arbitragem e o Brasil uma perspectiva múltipla", São Paulo, SP, 13.11.1996. Original datilografado em curso de publicação (gentileza do autor). dois séculos passou a sofrer intervenção do Estado"', são solucionados através das várias formas que analisaremos a seguir, sem ter, é claro, a mínima pretensão de esgotar o terra, mas, apenas, dar uma pequena contribuição ao debate.
2 - Formas de solução dos conflitos trabalhistas
A maioria dos autores adotam a classificação criada por Niceto Alcalá Zamora y Castillo: formas de solução de conflito auto-defensivas, autocompositivas e processuais(9). Diverge de Zamora Wagner Giglio, classificando em formas autocompositivas e processuais, pois assevera que a forma autodefensiva, por ser uma forma de solução parcial e egoísta do conflito imposta por um dos litigantes, consiste apenas num instrumento para se alcançar a autocomposição, ou se chegar a arbitragem".
Octavio Bueno Magano, a seu lado, enfatiza que os conflitos são solucionados através da autocomposição, em havendo a prevalência da vontade das panes, e, pela heterocomposição, através da sujeição da vontade de ambas a terceiro'', classificação que adotamos por ser a mais simples. No contexto, o sistema autocompositivo compreende a conciliacao, e mediacao e a negociação coletiva. O sistema heterocompositivo compreende a arbitragem e a solução jurisdicional. (6) No passado houve grandes dificuldades para que os indivíduos se sujeitaram às decisões estabelecidas pelos tribunais, seres estranhos. Para tanto, foi atribuída a esses órgãos a origem divina para que suas decisões pudessem ser aceitas com mais facilidade pelos indivíduos.
A conciliação, que na maioria das vezes é vista como uma etapa preliminar na solução dos conflitos, é uma forma pacífica de se dirimir conflitos. Consiste na utilização dos serviços de um terceiro, neutro, que ajudará as partes a chegarem a uma solução. A conciliação pode ser voluntária, quando ocorre através da vontade das panes, e obrigatória, quando se oferece às partes uma tentativa necessária de conciliação, já que a recusa a tentativa acarreta na impossibilidade de se procurar outros meios de solução.
Os primeiros Órgãos governamentais de conciliação surgiram em 1874, em Maryland, nos EUA. Hoje, no direito comparado, há precedentes da conciliação na Finlândia, que só permite que uma categoria entre em greve após tentativa, por parte do Governo, de celebrar a conciliação; na Suécia e na Sufoca, existem escritórios governamentais de conciliação. Na Itália é reconhecida a possibilidade de conciliação através da comissão instituída perante o Órgão provincial do trabalho, ou através do juiz(12).
A mediação consiste na "intervenção desinteressada de terceiros". Difere-se da conciliação, levando-se em consideração o grau de intervenção do terceiro. Enquanto que na conciliação, de regra, não existe formulação de proposta por parte do conciliador, na mediação, o mediador ouve, avalia, sugere e propõe soluções. Tanto a que autores como Deveali afirma ser a mediação uma forma intensa de conciliacao", e Russomano afirma ser uma forma suave de arbitragem".
No diapasão, Arion Sayão Romita sublinha que "enquanto a mediação se contenta com uma composição qualquer, a conciliação aspira a uma composição justa"(15). A mediação é muito utilizada na França e nos EUA. No Brasil, usada através das mesas redondas nas Delegacias Regionais do Trabalho antes da instauração do dissídio coletivo". A negociação coletiva tern sido definida como "um processo de ação recíproca entre as direções das empresas e a representação organizada dos trabalhadores destinado a fixar e aplicar termos e condições de trabalho"" ou como "instrumento paritário de elaboração de normas para regerem as condicoes de realizacao do trabalho"". Ela nasce da ideia de autonomia privada coletiva, consistindo na auto-regulação através de um processo de ação recíproca entre as direções das empresas.
"A arbitragem e os conflitos coletivos de trabalho no Brasil".
Asseveração organizada dos trabalhadores, materializando-se através dos contratos coletivos, convenções e acordos coletivos. Ampliando o quadro de asseverações, sublinhe-se que a convenção coletiva consiste num instituto de câmara normativo celebrado entre a organização representativa dos empregadores e a organização representativa dos trabalhadores, relativo às condições de trabalho.
O acordo coletivo, por seu lado, consiste no instituto de caráter normativo, celebrado entre a organização representativa dos trabalhadores, ou, em sua falta, representantes dos trabalhadores interessados e eleitos, com uma ou mais empresas, relativos às condições de trabalho. De notar, que a despeito de se falar que a negociação coletiva é uma força de solução dos conflitos, o que soluciona o conflito é o instrumento resultante da negociação consagrado através da convenção ou do acordo coletivo, porquanto, a negociação é simplesmente um instrumento. A arbitragem é um dos mais antigos meios de solução dos conflitos. Surgindo na Grécia, consiste em submeter o conflito a decisão de terceiro, pessoa, grupo, entidade administrativa ou órgão judicial. Sua evolução ocorreu no Direito Romano em sua modalidade obrigatória, pois o pretor preparava a ação, primeiro mediante o enquadramento na ação da lei, e, depois, acrescentando a elaboração da fórmula, e, em seguida, submeter o julgamento a urn iudex ou arbiter, objeti- vado por urn particular estranho ao corpo funcional roma- no, desde que idôneo, que tinha a incumbencia de solver o litigio. Quintiliano, gramático de profissão, foi inúmeras vezes nomeado arbitrário, tanto que veio a contar, em livro, as suas experiencias".
Não se confunde com arbitramento, embora tenham a mesma raiz etimológica (do latim arbiter, juiz ou árbitro). O arbitramento procura determinar o valor de fatos ou coisas para se chegar a equivalência pecuniária (Pode ser voluntária (voluntary arbitration), que decorre da submissão espontânea das partes a um árbitro, ou a um tribunal arbitral, é obrigatória, que é imposta pelo Estado para solução dos conflitos(21).
Para se recorrer a arbitragem é necessária a existência de uma cláusula compromissÓria inserta em urn instrumento escrito, que pode ser urn acordo ou uma convenção coletiva, e que se destina a solucionar um litígio futuro que pode até não surgir, ou de urn compromisso arbitral que consiste num instrumento criado no instante da controvérsia, objetivando solucioná-la. A arbitragem voluntária teve origem e maior desenvolvimento nos EUA e no Canadá.
90% dos contratos coletivos dispõem que as controvérsias serão resolvidas por árbitros privados. La a arbitragem pode ser de duas formas: arbitragem de queixas (grievance arbitration), que tern por objetivo dirimir as controvérsias oriundas "das convenções coletivas, isto é, conflitos de natureza jurídica a respeito de aplicação ou interpretação desses convênios"'"), e arbitragem de interesses (interest arbitration), destinada a "fixação de novas condições de trabalho, como salários, horários, pensÕes e vantagens sociais"'"'. Nos Estados Unidos, os árbitros são escolhidos pelas partes livremente, em agendas especializadas como a FMCS (Federal Mediation and Conciliation Service) - Órgao público; AAA (American Arbitration Association), (fora privado. De ressaltar que os árbitros considerados mais competentes são os oriundos da National Academy of Arbitration. Digno de menção a que a arbitragem voluntária contou com pouca aceitação nos países da america-latina. Por outro lado, existe registro da arbitragem obrigatória na Argentina, Equador, Peru, Nicarágua, Bolívia, México, Panamá, Guatemala, Paraguai, Venezuela e Colômbia. No Brasil a sua aplicação em qualquer das áreas é muito pequena. Utilizada na maioria das vezes em seara de Direito Internacional Público°, e, raramente no Direito Comercial.
A primeira vez que o Brasil recorreu à arbitragem foi no caso Christie, na Inglaterra, envolvendo oficiais da Marinha Britânica, tripulantes da Fragata Forte, detidos no Rio de Janeiro. O caso foi solucionado pelo Rei Leopoldo da Bélgica em 18.6.1863.
Outras questÕes internacionais, desta vez de fronteiras, foram resolvidas pela arbitragem:
1) Com a Bolívia, sobre a Questão do Acre, através do tratado de Petrópolis, em 17.11.1903;
2) Corn a Argentina sobre o Território de Palmas ou das Missões, através do tratado arbitral de 7.9.1889, cujo árbitro foi De Grover Cleveland, presidente dos Estados Unidos, e o Barão do Rio Branco defendeu os interesses brasileiros;
3) Corn a Franca, sobre a região do Amapá corn a Guiana Francesa, resolvi- dá através do Tratado de 10.4.1897, cujo árbitro foi o Presidente do Conselho Federal Suico, Walter Hauser, tendo o Barão do Rio Branco defendido novamente os interesses brasileiros;
4) Cor na Grã-Bretanha, por terras da Guiana Inglesa, através do Tratado de Londres de 6.11.1901, cujo árbitro foi o Rei Vítor Emanuel III da Itália, com Joaquim Nabuco representando os interesses do Brasil. O Código Comercial de 1850, ainda vigente "estabelecia em alguns de seus dispositivos a arbitragem obrigatória, como p. ex., no art. 294, nas causas entre sÓcios de sociedades comerciais, "durante a existência da sociedade ou companhia, sua liquidação ou partilha", regra que era reafirmada no art. 348. O Regulamento 737, daquele ano, conhecido como primeiro diploma processual brasileiro codificado, por sua vez, previa em seu art. 411 que seria o juízo arbitral obrigatório se comerciais as causas. A Lei 1.350, de 14.9.1866, no entanto, revogou aqueles dispositivos, sem contestação a época".
O CPC de 39 e o de 73 adotaram a arbitragem de forma facultativa. A Lei 7.244, de 7.11.1984, instituidora dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, posteriormente revogada pela Lei 9.099, de 26.9.1995, instituidora dos Juizados especiais cíveis e criminais, previa a arbitragem facultativa al:6s a tentativa de conciliação, sendo o árbitro necessariamente urn advogado, embora o laudo dependesse de homologação pelo juiz. A mesma lei revogadora através do art. 24 também prevê que no caso o árbitro deve ser escolhido dentre os juízes leigos e conciliadores, cujo laudo será homologado pelo juiz togado.
No âmbito Constitucional, existe previsão no art. 217 § 14 e 24 e no art. 114 § 125'. Recentemente, em questÕes comerciais e civis, que, na minha (Rica, podem ser estendida às questÕes trabalhistas, o Brasil deu urn grande passo no sentido de incrementar o uso da arbitragem, corn a publicação da Lei 9.307, de 23.09.96, de iniciativa do "Instituto Liberal de Pernambuco", corn patrocínio do ex-Senador Marco Maciel.
Elaborada por uma comissão de Juristas especializados na área, foi publicada no Diário Oficial da União em 24.9.96, corn vacatio legis de sessenta dias, que passou a viger a partir de 23.11.96, revogando os artigos 1.037 a 1.047 do CÓdigo Civil e os artigos 1.072 a 1.102 do C6digo de Processo Civil, além de alterar o artigo 267, 302, 584 e 520 também do CPC. Nos moldes da lei, qualquer pessoa capaz de contratar poderá valer-se de árbitros para dirimir litígios, desde que se refiram a direitos patrimoniais disponíveis (art. 19. Interpretando o preceptivo, conclui-se que foi criada uma arbitragem voluntária para as partes capazes de contratar.
A arbitragem pode ser de direito ou de equidade (art. 2). As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção arbitral, assim entendidos: a cláusula compromissória, que consiste na convenção inserida num contrato, pela qual as panes se comprometem a submeter qualquer questão dele oriunda a arbitragem, e o compromisso arbitral, que consiste num instrumento arbitral expresso, através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem.
O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou homologação pelo Poder Judiciário. A sentença arbitral estrangeira, para ser reconhecida ou executada no Brasil, depende de homologação pelo STF (art. 35). Para efeitos penais, "os árbitros são equiparados aos funcionários pÚblicos, a ensejar o enquadramento dos (25) 0 § 1" do art. 217 da CF frisa: "O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas ap6s esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei". § 24 estipula: "A justiça desportiva tern o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo para proferir decisão final". O § 14 do art. 114 assinala: "Frustrada a negociação coletiva, as panes poderão eleger árbitros". mesmos na tipologia criminal em ocorrendo deslizes de comportamento". Até o surgimento dessa lei, a arbitragem no Brasil não era muito utilizada, por vários motivos, dentre eles o custo da arbitragem que de regra é muito oneroso.
Com a publicação da lei, vozes surgiram alegando ser a mesma inconstitucional ao argumento de violar o princípio constitucional da garantia do direito de ação, ou da inafastabilidade do judiciário previsto no artigo 54, inciso XXXV, da Carta Maior. No pertinente a questão, estamos corn Sálvio de Figueiredo Teixeira quando combate a inconstitucionalidade da lei ao argumento de que:
1) "... a nova lei 6 explícita (art. 33) em assegurar aos interessados o acesso ao Judiciário para a declaração da nulidade da sentença arbitral nos casos que elenca, em procedimento hábil, técnico e de maior alcance do que o criticado procedimento homologatório do sistema anterior";
2) "... pela igual possibilidade de arguir-se nulidade em embargos à execução (art. 33, § 3s, c/c art. 741, CPC)";
3) " porque a execução coativa da decisão arbitral somente poderá ocorrer perante o Judiciário, constituindo a sentença arbitral título executivo judicial, assim declarado na nova redação dada (pelo art. 41) ao inciso III do art. 584 do Código de Processo Civil. De igual forma, a efetivação de eventual medida cautelar deferida pelo árbitro, reclamar a atuação do juiz togado, toda vez que se fizerem necessárias a comércio e a execu- tio";
4) "... porque, para ser reconhecida ou executada no Brasil (art. 35), a sentença arbitral estrangeira se sujeitará homologação do Supremo Tribunal Federal (ou de outro Órgão jurisdicional estatal - v.g., o Superior Tribunal de Justiça -, se a Constituição, reformada, assim vier a determinar)";
5) "... porque o Judiciário e o controle" sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento";
6) " porque também caberá ao Judiciário decidir por sentença acerca da instituição da arbitragem na hipótese de resistência de uma das partes signatárias da cláusula compromissaria". A soup:10 jurisdicional consiste na solução posta pelo Estado-juiz. A Jurisdição é o poder de dizer o direito, que em decorrência do imperium pertence ao Estado, e este por delegação atribui às autoridades judiciárias. A solução jurisdicional dos conflitos 6 utilizada em quase todos os países do mundo como sistema final e rígido de solução. A substituição da jurisdição pela vontade das partes, realiza-se por meio da aplicação do direito objetivo ao caso concreto. Nos dissídios individuais e nos dissídios coletivos de natureza jurídica, "em que a (mica exigência é fazer atuar o direito, não existem dúvidas quanto a necessidade da atuação jurisdicional".
3 - Formas de solução dos conflitos trabalhistas no Brasil
No Brasil, os sistemas solucionadores de conflitos também são os que acabamos de tecer algumas considerações, quais sejam: os autocompositivos (conciliação, mediação e negociação coletiva), e os heterocompositivos (arbitragem e solução jurisdicional). No pertinente à conciliação, no Brasil, a voluntária encarrega-se de resolver a maior parte dos conflitos individuais e coletivos, embora não seja ela considerada pressuposto processual ou condição da ação jurisdicional"'. Interessante ressaltar, que uma vez ajuizada jurisdicional, seja individual ou coletiva, a Consolidação das Leis Trabalhistas do Brasil, através dos arts. 846 e 850 exige que seja tentada a conciliação antes e depois da realização da instrução processual, pena de nulidade processual.
No atinente a mediação, de frisar que esta não muito comum no Brasil. Ocorre, entretanto, através das mesas redondas nas Delegacias Regionais do Trabalho("), haja vista que o Serviço Nacional de Mediação, criado através do Decreto 88.984/83, atua junto às Delegacias Regionais do Trabalho, e é um setor de mediação dos dissídios coletivos no Brasil. No concernente a negociação coletiva, no Brasil a lei obriga o empregador a manter negociação coletiva corn os trabalhadores, e, se bem sucedida, culmina com a elaboração de uma convenção ou acordo coletivo, institutos esses reconhecidos na prÓpria Lex Fundamentalis de 1988 através do art. 72, inciso XXVI.
Entrementes, nem sempre foi assim. Outrora os sindicatos não tinham uma mentalidade reivindicatória mas apenas assistencialista, e limitavam-se a pleitear melhorias salariais. Só a partir da década de 70, em face de não poder contar corn o Estado autoritário, o sindicalismo brasileiro se mobilizou, passando a negociar diretamente corn o patrão, firmando, neste sentido, acordos e convenções coletivos de trabalho, garantindo corn into, direitos trabalhistas através da normatização autônoma.
Hoje, a própria Lex Legum permite, desde que através da normatização autônoma, a redução ou o aumento da duração do trabalho, e até a redução salarial (art. 74, VI). Paralelamente ao desenvolvimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho, surge, no Brasil, através da Lei 8.542, de 23.12.92, o chamado contrato coletivo, corn o escopo também de fixar condições de trabalho e salariais, proporcionais à extensão e a complexidade do trabalho. O Contrato Coletivo é um "instrumento normativo resultado de uma negociação de âmbito nacional, em um ou mais de urn setor econômico, realizados entre as Centrais, Federações ou Confederações nacionais de trabalhadores e patronais, cujas cláusulas podem estabelecer parâmetros obrigatórios a serem observados na convenção da categoria, ou em acordos coletivos da empresa". No tocante a arbitragem no Brasil, é particularmente triste consignar, apesar de existirem vários textos.
O Dissídio Coletivo de natureza econômica ou declaratória terá como pressuposto processual a negociação prévia, ou tentativa de conciliação. (27) O art. 846 gisa: "Aberta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação". Por seu lado, o art. 850 frisa: "Terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais, em prazo não excedente de 10 (dez) minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou presidente renovará a proposta de conciliação, e não se realizando esta, será proferida a decisão incentivando a arbitragem trabalhista, nunca houve uma grande utilização dessa forma de solução de conflitos.
O Decreto 1.037, de 5.1.1907, p. ex., criou mecanismos para resolver disputas trabalhistas mediante a arbitragem através dos próprios sindicatos'"). Mais tarde o Decreto 22.132, de 25.11.1932, instituiu a possibilidade da arbitragem facultativa, e, em certos casos, compulsória, para questões individuais.
Em 1983, foi expedido o Decreto 88.984, de 10.11.1983, que criou os Conselhos Federal e Regionais de Relações de Trabalho, e o Serviço Nacional de Mediação e Arbitragem, que passariam a funcionar perante as Delegacias Regionais do Trabalho, instituindo uma arbitragem pública facultativa em caso de conflitos coletivos.
A Constituição Federal de 1988 através do art. 114, §§ 1º e 22 estipula: § 1º: "Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros"; § 29: "Recusando-se qualquer das panes a negociação ou a arbitragem, é facultado aos respectivos sindicatos ajuizar dissídio coletivo..." A própria Lei Complementar 75/93 - Lei Orgânica do Ministério Público da União - através do art. 83, XI atribui como competência do Ministério Público do Trabalho, independentemente de cláusula compromissória, "atuar como árbitro, se assim for solicitado pelas panes, nos dissídios de competência da Justiça do Trabalho". De registrar-se que a vantagem da utilização do Ministério Público do Trabalho como órgão arbitral é que não haverá pagamento de honorários arbitrários (CF art. 128, 110 (30).
Logo, reconhecida na Constituição Federal, porque a arbitragem trabalhista no Brasil não é amplamente utilizada?
Cremos que, com a publicação da Lei 9.307/96, principalmente nos dissídios coletivos, a arbitragem trabalhista deverá ser ampliada. Quanto aos dissídios individuais, acreditamos que a utilizacao da lei nao sera nefasta para os trabalhadores, haja vista a faculdade da escolha livre, pelas panes dos solucionadores do conflito, além de que ela contribuirá sobremaneira corn a questão da celeridade na solução dos conflitos entre capital e trabalho.
Por isso acho que todos devem fazer o possível e o impossível para a suscetibilidade da aplicação desta lei em sede trabalhista. No particular, concordamos corn Robert Davis" quando enfatiza que se retorna "ao primado da simplicidade e ao desapego a complicações, valorizados nos idos de 1930 e enquanto, no tempo, deram bons resultados, trazendo a vantagem, pelo menos teórica, de poderem as partes escolher, livremente, os juízes de seus litígios. O que, sob o ponto de vista da brevidade, muito contribuirá certamente, para afastar ou diminuir os incidentes e protelações
Autores existem, entretanto, que combatem a utilização da Lei sob comento em sede de dissídios individuais. Jorge Luiz Souto Maior(321 sublinha ser inadmissível, haja vista que "o direito do trabalho é um direito que não comporta, em princípio, a faculdade da disponibilidade de direitos por ato voluntário e isolado do empregado".
Por seu turno, Bueno Magano assevera que a arbitragem não é amplamente utilizada já que os direitos trabalhistas são irrenunciáveis e não transacionáveis, por serem tratados em normas de ordem pública.
Argumenta, ademais, que em face da Constituição Federal de 1988, o art. 5, inciso XXV 341 que trata do princípio da garantia do direito de ação ou inafastabilidade do Judiciário, ninguém pode ser impedido de ter acesso aos tribunais jurisdicionais. Quanto ao primeiro argumento, importa asseverar que os direitos trabalhistas são irrenunciáveis e intransacionável em qualquer lugar do mundo, pois que preconizado pela própria Organização Internacional do Trabalho, entretanto, em alguns países desenvolvidos do mundo a arbitragem a encarregada de resolver 90% dos conflitos trabalhistas corn a celeridade que sonhamos e que desejamos urn dia alcançar. Por outro lado, o fato de o art. 5Q, inciso XXV consagrar o princípio do direito de acao, faculdade de todo indivíduo titular de um direito subjetivo, lesado ou na iminência de o ser, desde que observando as condições da ação, nada impede que a arbitragem, forma rápida de solução dos conflitos, seja estimulada e incentivada por todas as formas e por todos.
No contexto, vaticinaram algumas propostas para que a arbitragem seja mais utilizada em campo trabalhista:
1) Utilizar a Lei 9.307/96 que entrou em vigor em 23.11.96, que revogou o CPC e o Código Civil, tratante da objetivação e procedimento da arbitragem civil e comercial de forma subsidiária, naquilo que for possível;
2) Interseção pelos sindicatos de cláusula compromissÓria em todas as convenções coletivas ou acordos coletivos;
3) Criação de Tribunais Arbitrais privados, capacitados e habilitados;
4) ou, enquanto não forem criados os tribunais arbitrais, que seja criada pelo Ministério do Trabalho, através das Delegacias Regionais do Trabalho, uma lista de árbitros competentes e qualificados, cujas sentenças arbitrais não dependem de homologação, não contrariem as normas legais, irrenunciáveis e intransacionável (CLT, art. 444), ou convencionais mais favoráveis aos trabalhadores (CF, art. 114, § 2º), nem tampouco decidir além dos limites fixados pela cláusula compromissória ou pelo compromisso arbitral 1351;
5) A utilização dos Órgaos do Ministério Público() do Trabalho, como árbitros, inclusive, sem ônus de honorários arbitrados para as panes;
6) As despesas corn honorários arbitrais, perícias e deslocamentos etc. devem ser divididos pro rata entre as entidades sindicais interessadas(36);
7) Ao Órgão jurisdicional trabalhista, pode-se recorrer apenas em caso de tentativa de se anular e de se executar a sentença arbitral. (32) Souto Maior, Jorge Luiz. "Arbitragem e Direito do Trabalho".
Acerca da solução jurisdicional dos conflitos trabalhistas no Brasil, exercida pela Justiça do Trabalho, o tema demanda que façamos uma retrospectiva acerca da evolução do Direito do Trabalho no Brasil. De partida, há que ser dito que as grandes distâncias e as deficiências de comunicação dificultaram sobremaneira a organização dos trabalhadores em sindicatos, impossibilitando o desenvolvimento da auto-composição. Diferentemente de outros países, os movimentos grevistas que ocorreram no início do século XX não culminaram na estruturação de sindicatos fortes, livres e reivindicativos.
O Brasil dessa época era essencialmente agrícola, com destaque para o nordeste açucareiro, pois, como os demais países latino-americanos, não viveu a Revolução Industrial, importante ao processo histórico do surgimento do Direito do Trabalho. Com a aboliçao da escravidao, a mão-de-obra na agricultura tornou-se escassa, dal a abertura para a imigração europeia, vindo inicialmente os italianos, que já contavam corn uma legislação trabalhista protetora, influenciando no surgimento das primeiras medidas protetoras ao trabalhador, embora relativas à atividade rural.
Depois os Alemães, Poloneses, Espanhóis, Portugueses etc. Em 1907 foi expedido o Decreto Legislativo n2 1.637, que instituiu os Conselhos Permanentes de Conciliação e Arbitragem destinados a solucionar conflitos entre capital e trabalho. Em 1922, através da Lei 1.869, foram instituídos os Tribunais Rurais do Estado de São Paulo, primeiros tribunais trabalhistas do país, que visavam resolver questões trabalhistas surgidas na agricultura. Em 1932, o Decreto 21.396 instituiu as Comissões Mistas de Conciliação, compostas de dois a seis vogais, encarregados de resolver dissídios coletivos mediante conciliação ou submeter o dissídio a juízo arbitral. Ainda em 1932, através do Decreto 22.132, foram instituídas as Juntas de Conciliação e Julgamento, encarregadas de conciliar e julgar os dissídios individuais. Posteriormente, corn a tomada do poder por Getúlio Vargas, houve a edição de grande mimero de leis trabaLhistas, não em decorrência de reivindicações das classes trabalhadoras, como na Europa, mas como uma dádiva do Executivo, recebida com desconfiança pelos empregadores e corn indiferença pelos empregados.
A Carta de 1934 criou a Justiça do Trabalho no Brasil, estabelecendo critério de paridade de representação das categorias profissionais e econômicas, embora pertencente ao Poder Executivo.
O Decreto-lei 1.237/39, que organizou a Justiça do Trabalho, criou os Conselhos Regionais do Trabalho, e reorganizou o Conselho Nacional do Trabalho. Em 12.5.43, através do Decreto-lei 5.452 foi promulgada a Consolidação das Leis Trabalhistas, jungindo todos os textos de leis existentes sobre Direito do Trabalho e Processo do Trabalho num só diploma; corn a Constituição de 1946 a Justiça do Trabalho foi integrada ao Poder Judiciário Federal. Para se ter uma ideia, a nossa primeira lei de greve surgiu apenas em 1964 - Lei 4.330/64 - durante o regime militar, o que impedia os sindicatos de exercerem seus direitos, com medo de represália.
Logo, a Justiça do Trabalho assume particular importância em nosso País, em detrimento das demais formas de composição dos conflitos. Isso ocorreu em virtude de alguns acontecimentos políticos como os períodos ditatoriais em que o Governo concentrava em suas mãos poder ditar as condições de trabalho, enfraquecendo os mecanismos de auto-regulação. Hoje, gigantesca, inchada, passando por dificuldades econômicas e cheia de burocracia que atingiu o Judiciário como um todo, gera uma defasagem entre os feitos que entram e os que são solucionados, acarretando um sério descrédito perante a população. Em 1990, 95 para ilustrar, as Juntas de Conciliação e Julgamento receberam 1.233.410 awes e solucionaram 1.053.237, resultando um saldo negativo 37).
Mesmo corn a ampliação da Justiça do Trabalho, em face da Lei 8.432/92, que criou 369 novas Juntas e 993 novos cargos de Juiz do Trabalho, e corn a instalação de 6 novos Tribunais e a reestruturação de 9 outros, todos os tribunais ainda estão abarrotados de processos. Em 1994, por exemplo, foram ajuizadas, como resultado do descumprimento da legislação estadual, em função de um cálculo de custo e benefício. Diante desse fato, é imperativo falar que a Justiça do Trabalho, que visava a garantia do emprego, hoje é chamada de Justica do não-Trabalho, voltada ao desemprego").
Em face dos inúmeros problemas que cercam a Justiça do Trabalho, como problemas económicos, grande nÚmero de processos, falta de servidores, falta de juízes, problema do poder normativo - que para uns a benefício, e, para outros, impossibilita a autocomposição problemas burocráticos, problemas corn os juízes classistas que abocanham grande parte do orçamento da Justiça do Trabalho etc., doutrinadores, juízes e cientistas sociais, propõem soluções que vão desde uma reforma processual total até a criação de Órgãos populares. A tÍtulo elucidativo, foi criado no Rio Grande do Sul, pela Delegacia Regional do Trabalho, o Plantão Especial para Denúncias e Mediação dos Conflitos Individuais Trabalhistas, composto de fiscais dotados de conhecimentos jurídicos, encarregados de solucionar, extrajudicialmente, conflitos entre empregado e empregador.
O problema é que a solução posta não impede o ajuizamento da nab perante a Justiça do Trabalho, pois não terá força de coisa julgada. A cidade mineira de Patrocínio criou, sob a coordenação e intermediação da Junta de Conciliação e Julgamento da cidade, e trabalho, soluções essas posteriormente homologadas pelo Juiz.
Em 1991, o TST formou uma Comissão integrada pelos Ministros José Luiz Vasconcellos e Carlos Alberto Barata Silva, destinada a elaborar um CÓdigo de Processo do Trabalho tentando reformular integralmente o atual sistema processual, mas, infelizmente até hoje o anteprojeto não perdeu a condição de anteprojeto. Há autores, como Antônio Álvares'"), que defendem a criação no Brasil de Conselhos de Empresas, baseando-se na Cogestão da Alemanha, como Órgãos encarregados, por força de lei, de representar os empregados de uma empresa junto ao empregador, a quem seria atribuída a função de conciliar as demandas dentro da própria empresa.
O Deputado Victor Faccioni, encampando iniciativa do Colégio de Presidentes e Corregedores dos TRTs, apresentou ao Congresso um Projeto de Lei visando a inserção do art. 923 na CLT, que visa criar órgãos extrajudiciais de conciliação. Encontra-se em tramitação no Congresso Nacional várias propostas de Emendas à Constituição (PEC): a de n2 (39) cf. Silva, Antônio Álvares. "Mudanças fundamentais para uma Nova Justiça do Trabalho".
Transformando
Sonhos em Realidade
Na primeira parte da minha autobiografia, conto minha trajetória, desde a infância pobre por diversos lugares do Brasil, até a fundação do grupo Ser Educacional e sua entrada na Bolsa de Valores, o maior IPO da educação brasileira. Diversos sonhos que foram transformados em realidade.