Trabalho apresentado no Seminário Hispano Brasileiro de Direito do Trabalho em Madri, Espanha)
Convidado a palestrar na cidade espanhola de Madri, em seminário internacional de Direito do Trabalho, versando o ternário sobre "O Trabalho da Mulher no Ordenamento Jurídico Positivo Brasileiro", achamos ser de boa política abordar um assunto muito em voga: O "Assédio Sexual sofrido pela mulher trabalhadora e a indenização subjetiva em face ao dano moral sofrido", porquanto é um problema que viesse alastrando não só no Brasil, mas no mundo inteiro.
Nesse diapasão, de ressaltar que, apesar de ser lugar comum dizer-se que tantos os homens quanto as mulheres podem ser sujeitos passivos do assédio sexual, as pesquisas que vêm sendo realizadas têm-nos mostrado que, na maioria das vezes, as vítimas são as mulheres. Nesse contexto, com perfume de brevidade, será posto nossa contribuição sobre o tema.
Iniciaremos o trabalho definindo o vocábulo "assédio". Socorremo-nos do Aurélio l para asseverar que o termo "assediar" significa "perseguir com insistência", "importunar, molestar, com perguntas ou pretensões insistentes". Outrossim, o assédio sexual pode ser consubstanciado por atos como gestos, comentários jocosos e desrespeitosos ao sexo oposto, afixação de material pornográfico, avanços de natureza sexual, etc., por parte de superior hierárquico, chefe, supervisor, encarregado, gerente, preposto, colega de trabalho, cliente, etc.
Ampliando a seara de considerações, frise-se que para certo autor o assédio sexual "é uma forma de discriminação e de abuso de poder, sobretudo uma violência contra as mulheres". Do ponto de vista sociológico, é uma forma de dominação das mulheres pelos homens, pois que são eles desde a infância educados dessa forma.
De notar, entretanto, que não são somente as mulheres que sofrem esse tipo de problema. Os homens, também, podem ser sujeitos passivos, embora as estatísticas mundiais mostrem que a maioria das vítimas são as mulheres.
Neste opúsculo trataremos do assédio sexual como importunação da mulher trabalhadora2 através de cantadas agressivas, de propostas indecorosas e humilhantes por parte do empregador, representante legal seu como gerente, capataz, diretor, dirigente, etc.
Aumentando a área de manifestação, auspicioso ponderar que o problema do assédio sexual por parte de superior hierárquico para com suas subordinadas vem-se tornando comum não só no Brasil como também nos países do além-mar. No Brasil, um caso bem conhecido é o de certo dirigente do Partido dos Trabalhadores do regional gaúcho, denunciado por dezenas de mulheres em face de "piadinhas grosseiras e insinuações sexuais" para com as militantes daquele partido.
A guisa de ilustração, e no afã de ampliar a égide de discussão, não podemos deixar de registrar os escritos publicados em brilhante texto no JORNAL TRABALHISTA por Adélson do Carmo Marques 3 . Enfatiza o citado autor que é muito comum a questão do assédio sexual não só no Brasil mas também no estrangeiro, e cita uma manchete publicada na Folha de São Paulo de 12.05.94, página 39, nos seguintes termos: Estagiária grava assédio sexual de diretor no PR. Outrossim, coloca de manifesto em seu artigo dois casos de repercussão internacional. Um de uma executiva dos Estados Unidos que obrigou um subalterno a tornar-se seu amante. Este empregado, em face do ocorrido, se demite e depois ajuíza ação pleiteando reparação por danos morais. O outro caso citado é o do Presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, que foi acusado por uma funcionária do partido a que pertencia de assédio sexual. Acrescentamos aos exemplos citados o caso muito famoso de um juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, que, em tudo de denúncias por parte de sua secretária, de assédio sexual, teve dificuldades em ser nomeado juiz daquela Corte Suprema.
Aqui no Brasil, como foi dito, a questão é muito comum, embora a maioria das vítimas não denuncie o fato às autoridades. As causas da não-objetivação das denúncias são as mais diversas. Na maioria das vezes, as vítimas não denunciam por temor de perder o emprego. Noutros casos, por medo de sofrerem retaliação por parte do empregador acusado. Entrementes, a causa mais forte, na nossa ótica, é exatamente a cultura brasileira, que é imensamente machista, a chamada sociedade do "femeeiro" de Gilberto Freyre em Casa-Grande & Senzala4 . Ainda hoje, para a maioria das pessoas, um ato dessa envergadura é muito normal no bojo da nossa sociedade.
Importante ressaltar que não há confundir relacionamento ativo entre homens e mulheres, caracterizado pela reciprocidade, com o assédio sexual, embora a fronteira entre o assédio e o relacionamento ativo seja muito tênue. A simples cantada ou à paqueração constante, embora possa vir a ser considerado assédio, com este, à primeira vista, não se confunde. A cantada poderá transformar-se na importunação assediosa se for feita de forma agressiva, ou se forem oferecidos favores em troca da facilitação sexual por parte da mulher.
Recrudescendo a área de análise, registramos que o problema da importunação assediosa para com a mulher trabalhadora é mais patente perante a classe das domésticas e das secretárias. Em relação às secretárias, verbi gratia, o problema é tão grave que o Paulo, preocupado com o alto índice de reclamações de suas associadas, elaborou uma cartilha contendo diversas orientações. Consta dessa cartilha que a maioria das mulheres não denunciam o assédio sexual por vários motivos, como: 1) medo de represálias ou retaliação; a) medo de perderem o emprego, já que dependem dele para sobreviver; b) medo de serem rebaixadas; c) de serem transferidas; 2) não querem expor-se ao ridículo frente aos colegas, familiares e amigas; 3) medo de perderem a carta de referência; 4) por simples dificuldade de falar; e, 5) por acreditar que não há recursos para tratar de maneira eficaz o problema.
O Sinsesp elaborou recentemente uma pesquisa com 1 .040 mulheres, obtendo os alarmantes dados: 26.83% das mulheres entrevistadas já foram vítimas de assédio sexual; 24.71% conhecem mais de uma pessoa que foi vítima de assédio; 59% das pessoas que cometem assédio sexual são de classe mais alta; 14.33% das mulheres sofreram represálias (demissão, perda de promoção, transferência, ambiente hostil) em decorrência de repulsa ao assédio.
Por outra parte, pesquisa realizada no início de fevereiro desse ano, pela Brasmarket, em doze capi- tais do Brasil, com 2.206 mulheres, chegou-se à surpreendente conclusão de que 52% das mulheres entrevistadas que trabalham consideram que já foram assediadas sexualmente.
E claro que ato desse jaez, além de ser repugnante e repelente por parte da sociedade de bem, é imensamente prejudicial à mulher obreira, que na maioria dos casos aguentam em silêncio a importunação, receiosas de perder o emprego. A categoria está a clamar por uma regulamentação legal do fato a constitui-lo em crime, no afã de que tal problema, se não diminua, não recrudesça.
O problema já chegou a tal envergadura que foi objeto por parte da imprensa de várias reportagens escritas em revista de elevada aceitação naciona1 5 e falada em programa de TV de elevado índice de audiência apresentado no dia 25.06.95.
Felizmente, o anteprojeto do novo Código Penal, na parte que trata "Dos crimes contra a liberdade" através do art. 195 tipifica o assédio sexual como crime, quando testifica: "Assediar alguém com pro- postas de caráter sexual, prevalecendo-se de relações de autoridade, empregatícias, domésticas ou da confiança da vítima": detenção de um a dois anos.
Por outro lado, foi recentemente apresentado no Congresso Nacional um projeto de lei pela Deputada Federal Marta Suplicy, dando continuidade ao trabalho da ex-deputada Federal do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, Maria Luiza Fontenele, tentando tipificar o assédio sexual como crime.
O projeto de lei apresentado por Marta Suplicy, de nº 143/95, "dispõe sobre Crimes de Assédio Sexual e dá outras providências", tipifica o "Assédio Verbal" e o "Assédio Físico".
Pelo projeto, constitui "Assédio Verbal" constranger mulher ou homem, por meio de palavras ou gestos, no afã de obter favorecimento ou vantagem sexual (inciso I do art. 22).
Por outra parte, constitui "Assédio Físico" o constrangimento de mulher ou homem, através de meios físicos, utilizando violência ou grave ameaça, fraude ou coação psicológica, com o escopo de praticar atos sexuais (inciso II do art. 2º).
Em se tratando de assédio verbal, o crime será punido com detenção de um mês a um ano, mais multa. No caso de assédio físico, o crime será punido com reclusão, de dois a quatro anos, mais multa.
Serão considerados circunstância que agravaria a pena de até o dobro "os atos de coação, constrangimento com ou sem violência, de empregado, preposto ou chefe imediato que, prevalecendo-se de cargo ou função, ameaçar empregado com rescisão contratual, redução de posto ou salário, transferência e corte de ascensão profissional" (art. 3º, inciso l).
De acrescentar que esses crimes serão considerados de ação pública, ou seja, independeria de ajuizamento da ação penal pela ofendida, sendo necessário apenas a notícia do fato para que a autoridade policial instaure o competente inquérito, com a consequente denúncia pelo Ministério Público.
Oxalá seja aprovado em ritmo de urgência urgentíssima.
No entretanto, enquanto o projeto não é aprovado, juridicamente, em havendo a importunação sexual reiterada, quais as providências que a mulher obreira poderá tomar?
Inicialmente, é cediço que a resolução contratual pode ser objetivada tanto por parte do empregador quanto por parte do empregado, desde que um deles cometa qualquer fato tipificado nos arts. 482, 483 ou em outro preceptivo tipificador de falta grave prevista em lei.
Em se tratando de resolução do contrato de trabalho por parte da mulher empregada, que opera efeito ope judicis, esta poderá "considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei ,contráriosaos bons costumes ou alheios ao contrato; e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.
Pois bem, de partida, cabe à mulher trabalhadora pleitear perante à Justiça do Trabalho, em face do art. 114 da atual Lex Fundamentalis, a rescisão indireta do contrato de trabalho fundamentada nas alíneas a e c do art. 483 da CLT. Depois, como pedido mediato, deve pleitear as indenizações trabalhistas fundadas na responsabilidade objetiva do empregador "que se torna devedor pelo só fato de não ter a empregada praticado ato justificador da resolução contratual", e ao mesmo tempo, também sob os auspícios da Justiça obreira, acumular o pedido de indenização por danos morais em virtude do que preceitua o art. 1º inciso III, da CF, art. 59, inciso X, também da Carta Magna, e art. 1548, inciso II, combinado com o art. 98 do Código Civil, além da Súmula do STJ de n Q 37. Estipula o art. 1º, inciso III, da Constituição Federal:
Se observarmos os preceptivos constantes do título IV do Código Penal que tipifica os Crimes contra a Organização do Trabalho, nenhum tipo encontraremos para abordar o assédio sexual verbal ou físico. Entrementes, em procedendo à interpretação dos artigos 146, 213, 214, 215 e 216, podemos tipificá-lo como crime Contra a Liberdade Pessoal ou Sexual.
Transformando
Sonhos em Realidade
Na primeira parte da minha autobiografia, conto minha trajetória, desde a infância pobre por diversos lugares do Brasil, até a fundação do grupo Ser Educacional e sua entrada na Bolsa de Valores, o maior IPO da educação brasileira. Diversos sonhos que foram transformados em realidade.